domingo, 12 de maio de 2013

Entre aspas.


"E não desembaraçaram ainda, nem os meus cabelos, nem meus pensamentos. E eu continuo de ressaca, mesmo sem ter ingerido uma gota de álcool sequer. 
Fui lá na praia, vi o mar revolto, testemunhei a altura que as ondas alcançaram. O mar e eu de ressaca, juntos. Parceiros de vida. E os surfistas se aproveitaram da fúria das águas, da mesma forma que os pensamentos tortuosos se aproveitaram da minha embriaguez, para deslizarem soltos, brincando de equilibristas. E por mais que eu balançasse a cabeça, eles não saiam, agarravam-se às partes vizinhas, orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos meus ombros. E aí ficou tudo tão embaraçoso que, assim como o mar faz com as suas ondas, eu também deixei rolar, e me deixei ser levada pelo mar. 
E se a ressaca me embolou nas águas e não me deixou boiar, ela também não me deixou afogar, e não foi água salgada que eu bebi, foi inquietude necessária para tratar de viver, e me deixar puxar pra dentro, de mim e do mar. 
Submersa, mesmo com toda a nossa volubilidade (minha e do mar), meus olhos de ressaca contemplaram o fluxo e o refluxo da maré cheia e eu me esvaziei de novo, para assim como a maré, me encher outra vez."
Machado de Assis