quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Último pôr do Sol

"Me acostumei com você sempre reclamando da vida
Me ferindo, me curando a ferida,
Mas nada disso importa, vou abrir a porta pra você entrar"


Essa música me faz lembrar um grande amigo. Sempre que a escuto, minha memória me leva para um dia de sábado, em uma cidade próxima. Cantei essa música com ele, dentro de um ônibus, em direção ao centro. Foi o último dia que o vi. Eu não sabia que seria assim, claro, mas acho que ele sabia. Sim, ele sabia...
Logo cedo, depois de carregarmos minha mala por centenas de metros com ele brigando comigo, e com todo mundo, como sempre fez, nos cansamos. Ele viu que tinha um carrinho de feira dando bobeira na porta do Extra e teve a genial ideia de pegá-lo. Colocamos a minha mala dentro do carrinho e saímos andando até o ponto de ônibus mais próximo. O carrinho, obviamente, fazia um barulho infernal na calçada, chamando a atenção de todos.  Briguei com ele porque não deveríamos pegar algo do supermercado sem pedir e ele brigou comigo porque minha filosofia de que ele falava errado caía por terra.

- Você diz que eu falo errado o ‘ê’ e não ‘é’ em todas as palavras do mundo por causa do meu sotaque, porque falou “Êxtra” e não “Éxtra”? Me diga, quem está errado agora!?
- Estamos furtando um carrinho e você tá se preocupando com fonética de nome de supermercado?
- Mariana, relaxa, você não vai ser presa! O ponto do ônibus fica aqui na lateral do supermercado, depois eles passam recolhendo esses  carrinhos novamente. Se tivesse feito uma mala menor não estaríamos fazendo isso.
- Nós, mulheres, gostamos de ter muitas opções para ficarmos em dúvida na hora de escolher o que usar, por isso nossa mala é sempre grande.
- Pois da próxima vez traga uma mala com rodinhas.

Mas não teve próxima vez. No final da tarde voltei para a minha cidade. Nunca mais voltamos a nos ver.
Se eu me entristeço por isso? Bom, nossa história nasceu dessa forma e nem por isso fomos apenas mais um na vida do outro. É aquela saudade acostumada que todos nós temos de um amigo que está longe. Rodoviárias e aeroportos guardam milhares de histórias semelhantes a esta minha, não tenho exclusividade sobre ela.
O que sei é que, apesar disso, me restaram muitos recortes de lembranças boas que permeiam meus dias. Como aconteceu agora. Ouvir a música de Rita Lee me fez ficar com esse sorrisinho tímido no rosto. 
Minha mala está cheia de lembranças maravilhosas como esta do carrinho do supermercado. Foi essencialmente isso que ele me deixou: sorrisinhos de quinta feira. E de sextas. E de sábados. E de domingos.




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